Aqui a temos, então, a “terra do fim do mundo”: Ushuaia, capital da Terra do Fogo, como lhe chamou Magalhães, ao ver o fumo das fogueiras dos nativos.

Ushuaia, sim, lá na ponta mais ao sul da América do Sul, nas margens do Canal de Beagle, rodeada pelas montanhas do Glaciar Martial.

Ushuaia e o seu “Comboio do Fim do Mundo”.

Ecoa-nos na memória um certo “Expresso da Patagónia”, o lendário comboio de que nos falaram, não apenas Bruce Chatwin, mas também o seu amigo Paul Theroux (O Velho Expresso da Patagónia, 1979) e o chileno Luís Sepúlveda (Patagónia Express, 1995).

Não há, porém, vestígios de nostalgia neste “Tren del Fin del Mundo”, uma réplica do comboio que serviu o antigo presídio de Ushuaia, construído em 1896. O pequeno trem foi essencial na construção da prisão e no transporte de madeira para que os presos se aquecessem e pudessem cozinhar. Para esta colónia penal, o Governo da Argentina enviava não apenas criminosos, mas também presos políticos, que aqui viviam nas mais desumanas condições. Para eles, este era, certamente, o fim do mundo.
O presídio foi encerrado apenas em 1947.
Em 1994, começou então a funcionar uma versão turística do comboio, rememorando o seu dramático passado.
Ushuaia, Tierra del Fuego, Puerto Natales, Punta Arenas, Puerto Madryn, El Calafate… são nomes que a memória guardará para sempre com nostalgia.

Há, talvez, um feitiço na Patagónia, repartida entre a Argentina e o Chile, transportando uma longa história de isolamento, da mais dura sobrevivência, de mitologia e aventura, com essas cidades dispersas que parecem, na realidade, tão perdidas e desoladas como se estivessem naquilo que um dia se acreditou ser “O Fim do Mundo”.

Ainda Bruce Chatwin:
Li o seu livro uma vez antes de ir à Patagónia.
Já o li duas vezes desde que voltei.
Não sei se me atreverei a lê-lo outra vez.
Se o fizer, talvez recebam um SMS a dizer: “Fui para o Fim do Mundo.”
Não me perguntem porquê.

Margarida Fonseca Silva

Equipa philos